quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Uuel

Nós tínhamos decidido ir pra um país pequeno e pouco comentado da Europa, um lugar que não só a gente não conhecia, como nunca tinha ouvido falar de nenhum dos seus pontos turísticos, só entramos em um avião e desembarcamos por lá.
A primeira impressão que eu tive foi que as flores que davam aqui eram as mesmas que davam lá, mas será isso possível?
Andamos por umas ruas de pedra até encontrarmos uma espécie de restaurante, entramos, fora os trabalhadores, mais ninguém no lugar, o que não era de surpreender, em um país com população estimada de um milhão e duzentos mil habitantes.
Só a minha cidade tem mais gente que isso.
De qualquer maneira, ao entrarmos no restaurante a atmosfera de algum jeito se modificou, algo aconteceu no ar, nada que pudesse ser explicado e por isso ninguém falou nada.
O lugar era muito bonito, os móveis eram majoritariamente de madeira, com bonitas toalhas, um lago cristalino, cheio de natureza e trabalhadores muito muito impacientes, como se eles soubessem de alguma coisa que a gente não sabia, alguma coisa que queria que a gente não estivesse lá, mas não nos disseram nada.
A parte que começa a ficar palpavelmente estranha é a que ao invés de nos encaminhar pra uma mesa, nos levaram pro jardim, pra frente do lago e de alguma maneira nossas bagagens não estavam mais conosco.
Uma das funcionárias começou a me mostrar uma mesa, com uma caixinha cheia de compartimentos, dentro dos compartimentos, pequenos vidrinhos com florzinhas afogadas, tão pequenininho, tão bonito, é como se a moça soubesse que se eu fosse roubar alguma coisa, seriam aqueles frasquinhos, eu tinha um impulso muito forte de querer pegar os frascos, pôr no meu bolso e ficar comigo pra sempre. Assim o fiz.
Imagino que situações semelhantes tenham se apresentado aos meus companheiros de viagem, mas como ficará claro mais pra frente, não tive a oportunidade de perguntar.
Mas é como se eles quisessem provar um ponto, como se dada as devidas circunstâncias, todo mundo era vil.
Em algum momento começaram a aparecer os animais. Animais que não pareciam que deviam estar ali.
Por exemplo um tigre, adulto, como que hipnotizado, apareceu perto do lago, como uma miragem assustadora e linda, solta, bem ameaçadora, pra falar a verdade.
Eventualmente uma televisão do jardim foi ligada e nela cenas de tortura começaram a passar.
"Se você vai acabar fazendo isso com a pessoa, pra quê casou?"
Os funcionários pareciam nos odiar de maneira venal, como se nossa existência perturbasse a ordem de tudo.
O lago começou a ficar esverdeado, nojento, as árvores espontaneamente começaram a cair.
Nos levaram pra dentro do restaurante e quando parecia que finalmente tudo ia se normalizar eu notei alguns gatinhos debaixo da mesa, eu, que amo gatinhos e tenho três deles, disse: "Que lindos, são de vocês?" no que um dos funcionários me respondeu: "Não, não temos gatos nessa região, mas eles sempre aparecem quando precisar avisar do perigo, eles vêm de onde quer que seja pra avisar, se você, por exemplo..."
Entendi imediatamente que tinha que voltar para casa e eu só fui, sem bagagem, amigos, só corri em direção do aeroporto com nada mais que minha carteira e passaporte.
Os gatos que estavam debaixo da mesa vieram todos correndo junto de mim, inclusive o tigre, que visto assim, correndo do meu lado, não me apresentava perigo nenhum, só me avisava, como se pressentisse, como se soubesse de alguma coisa que eu ainda




Acordei.



E o nome da cidade em que estava, significa NOVO.

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