segunda-feira, 6 de julho de 2009
Pontos de vista.
Ela não tinha nada além da vida.
Na verdade havia mudado com os pais e irmãos para São Paulo dois meses antes da tragédia, procuravam moradia ainda.
Tragédia: Todos indo para praia, um caminhoneiro alterado por cocaína bate no carro e mata todos, exceto ela.
Mariella continua viva. Viva e sozinha. Sozinha mas feliz.
Sim, é claro que houve o desespero inicial, a dor, a sensação de desamparo..
Mas agora, bem, agora já faziam 3 anos, ela sobreviveu de fato, mesmo sem nunca ter achado a moradia que procurara com os pais, agora achara uma espécie outra família, graças ao desamparo, os mendigos a acolheram como filha, com seus 11 anos - data do ocorrido.
Não houve conselho tutelar, juizado de menores, abrigo ou nada assim, ela tinha medo, medo do que poderia passar, sempre assistiu filmes de orfanato, então preferiu se virar sozinha, mas não precisou.. foi acolhida, tinha o que comer graças aos trocados que recebia das pessoas.. caridosas?
De qualquer forma estava viva e Mariella era feliz de todo coração.
Tinha sonhos e perspectiva, tinha sorrisos sinceros e mais nada.
Tim nasceu em uma família rica, na região dos Jardins.
Frequentou as melhores escolas - mesmo detestando - e estudou tudo que seus pais quiseram.
Era filho único, cercado de amores e cuidados.
Tim era contra quem dava esmolas "isso incentiva esses vagabundos a continuarem na rua", por isso não dava nunca, mas aquela garota tinha chamado sua atenção por algum motivo.
Talvez pela alegria, ele nunca tinha sentido aquele tipo de alegria, a alegria que parecia orgânica e imutável, a alegria que provavelmente devia ter nascido com aquela garota tão machucada pelas dificuldades da rua, que estava longe de ser bonita, mas era como se brilhasse e brilhava de alegria.
De modos que quando ele recusou-se a ajudá-la tentou explicar o porque, Mariella era esperta e gentil, entendeu seus motivos e no final disse, irônica "mas agora tenho que ver se arranjo alguém menos instruído que você, sabe, vagabundos têm que comer. Com licença".
Tim se sentiu desconsertado e por isso continuou tentando falar com ela e na medida que era ignorado, crescia a vontade de comunicação, mas ela era totalmente inacessível quando queria, de modos que ele voltou pra casa.
Mariella poderia tê-lo escutado, mas depois de ouví-lo chamar sua "família" de "bando de vagabundos", seria hipocrisia dela. Não pensou mais em Tim.
Em contra partida Tim procurava-a em toda esquina e queria encontrar um porquê, por que ela era tão alegre?
Por que ele não era?
O que lhe faltava?
Tinha um futuro quase certamente bom, tinha amigos, pais carinhosos, não lhe faltava nada, todas as roupas e bugigangas que queria ele tinha.
Tinha tudo, tudo..
De modos que ver alguém tão avesso a ele acentuou sua insatisfação com o mundo e com a existência, não era correto, era injusto, por que ela tinha algo que ele não podia comprar?
Se tornou cada vez mais introspectivo e triste.
Nunca mais tornou a ver Mariella.
E quando resolveu que não aguentava mais uma infelicidade sem sentido, escreveu em um papel "Mariella", sem saber o porquê, já que nunca soube o nome da garota.
Então tirou uma foto fazendo pose de cowboy com a arma do pai - ele tinha uma coleção de armar antigas - depois disso deixou a câmera gravando, sorriu pra a mesma e disse "foi ela e sua felicidade", posicionou a arma de maneira elegante de baixo do queixo e no vídeo se via a bala sair pelo topo de sua cabeça. suicídio
Enquanto Tim terminava com seu sofrimento, Mariella, com uma margarida atrás da orelha, andava descalça sobre a grama verde do parque do Ibirapuera e soprava uma cottonflower, sorrindo o sorriso dos que sabem sorrir.
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3 comentários:
Fiquei perturbada. Quantos anos tinha essa garotinho, afinal? ._.
Fico imaginando isso numa tela, pessoas comendo pipocas e o seu nome no final com os créitos.
16, Lucy e era lindo.
Se continuar lendo o blog o conhecerá antes de tudo isso.
Boa idéia, Katrina, vou vender como roteiro, IUAHDIUS
Aliás, vou trabalhar em diálogos e tudo mais.
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